28 março 2008

Experiência da páscoa no cotidiano da juventude


- Artigo publicado no Jornal de Opinão Edição 981 - 20 a 26 de março de 2008 - Belo Horizonte-

Tenho apenas duas mãos e o sentimento do mundo...” (Carlos Drummond de Andrade).


Essa pequena frase do nosso poeta mineiro sempre me chamou atenção. É que às vezes nos sentimos tão impotentes, tão pequenos diante dos problemas e dificuldades que enfrentamos! E há tanto o que fazer...


Vejo por exemplo, nossa juventude. Cheia de vida e beleza. Muitas idéias, o sentimento do mundo. É um tempo de decisões importantes, decisões de vida. Que rumo tomar? Que profissão? Trabalhar, estudar, namorar, ajudar a família?


É um crime isso. O maior pecado que os seguimentos políticos, econômicos, sociais, familiares e educacionais podem cometer é retirar a esperança do horizonte dos jovens.


Aproximando-nos da festa da Páscoa, somos convidados a transformar nossos medos, inseguranças e pessimismo em esperança e vida. A Páscoa judaica era a memória de fé de um povo que conquistou a liberdade quando era escravo.


A ressurreição de Jesus igualmente iluminara as trevas dos discípulos frustrados e desorientados. Afinal, como é que foram matar alguém que só fez o bem? Alguém cujo projeto de vida foi vivido na justiça e na paz, que se orientava no amor até aos inimigos, que deu dignidade e vida a tanta gente. Ali, na cruz, depois de um julgamento injusto, também tentaram matar a Esperança. Mas os amigos de Jesus perceberam que o amor é mais forte que a morte e que o mestre se fazia presente em torno da comunidade reunida.


A narrativa dos discípulos de Emaús (ver Lc 24, 13-32), aponta na ressurreição não um evento fantástico e maravilhosamente inexplicável, mas a descoberta de uma presença consoladora de Jesus junto aos seus amigos frustrados. O episódio sinaliza para pequenos gestos cotidianos: uma conversa cordial cheia de sabedoria e uma refeição compartilhada num clima de gratidão.


Os jovens reunidos também podem sentir essa força da ressurreição. Toda vez que alcançam pequenas conquistas, toda vez que se alegram com a felicidade do próximo, quando lutam pelos seus direitos, quando realizam a solidariedade nesse mundo através do voluntariado e da política exercida em favor de todos, quando descobrem o valor do perdão e da partilha. É aí que Jesus se faz presente. Todas essas experiências pascais acendem uma luz onde se acreditava haver apenas desespero e frustração.


O túmulo está vazio, não há mais morte!


O Deus de Jesus é o Deus da Vida! Ele orienta o seu povo no caminho da esperança, no caminho da vida. Nas expressões juvenis, manifesta-se uma grande sede pela vida. A juventude não quer morrer, mesmo que as estatísticas possam dizer o contrário, a juventude quer viver.


Ninguém viu a ressurreição de Jesus acontecer. A fé na ressurreição começa no túmulo vazio, com o anúncio dos anjos às mulheres que pasmam diante da notícia inusitada. É despertada uma euforia ardente nos discípulos descrentes pelo encontro pessoal com Jesus ressuscitado. Assim, não são os fatos empíricos, mas a fé que é o epicentro dos relatos bíblicos da ressurreição. A ressurreição não se baseia em prova histórica, mas no testemunho da experiência transformadora que o encontro com Jesus produz entre os seus seguidores e seguidoras, experiências que ecoam e se repetem até hoje naquelas pessoas e comunidades que Nele crêem.


Enquanto houver discípulos do ressuscitado, deve haver esperança. E a esperança nos abre a uma sabedoria, a um saber viver orientado para o bem e para a partilha, a um reconhecimento da atuação de Deus na história. Nessa história, as pequenas experiências geradoras de vida não perdem seu sentido mesmo quando rodeadas de injustiça, maldade e desespero. Ao contrário, denunciam o mal e mostram que a morte não tem a palavra final.


Basta, portanto, abrir os “olhos do coração” para descobrir uma Presença escondida nos acontecimentos, no partir o pão. E essa Presença já era nossa companhia de viagem, estava no meio de nós... E diante de todo o sentimento do mundo, ainda temos duas mãos.


Tiago Luís Teixeira de Oliveira, ofm
Professor de filosofia na Rede Educafro e de Ensino Religioso no CSA