02 janeiro 2008

Heráclito de Éfeso

A característica principal dos filósofos pré-socráticos é a preocupação em responder os problemas relativos à origem de todo o universo, através da razão em oposição ao mito.

Como para os primeiros filósofos o problema filosófico por excelência era a questão cosmológica, foram chamados de físicos, naturalistas ou cosmólogos.

Também Heráclito, em quem este trabalho será estruturado, escreveu um livro intitulado “Sobre a Natureza”, do qual restam alguns fragmentos.

Heráclito nasceu em Éfeso, na Ásia Menor, entre os séculos VI e V a.C. De temperamento esquivo e desdenhoso, desprezava a multidão e os falsos sábios, criticava a tradição literária, a religião e a realidade política da cidade. Por isso, para evitar que pessoas ignorantes o procurassem, escreveu sentenças de modo obscuro e no estilo de oráculo, recebendo por essa razão o apelido de “Obscuro”. Retirando-se do meio dos homens, pôs-se a alimentar de ervas nas montanhas, mas precisou voltar à cidade para tratar de hidropsia, doença da qual morreu.

O que mais impressionou Heráclito não foi a experiência do múltiplo e sim do devir. Para ele tudo está em grande transformação: o mundo, o homem e as coisas que a cada instante vão se modificando.

“Em rio não se pode entrar duas vezes no mesmo, nem substância mortal tocar duas vezes na mesma condição; mas pela intensidade e rapidez da mudança dispersa e de novo reúne, compõe-se e desiste, aproxima-se e afasta-se” (Fragmento 91).

O devir ao qual tudo está destinado caracteriza-se pela alternância de contrários, em constante guerra. Por isso dizia Heráclito: “O contrário é convergente e dos divergentes nasce a mais bela harmonia, e tudo segundo a discórdia” (Fragmento 8).

E ainda: “O combate [entre opostos] é de todas as coisas pai, de todas rei” (Fragmento 53).

Na verdade são os opostos que dão sentido uns aos outros causando harmonia. A essa harmonia Heráclito chamou princípio ou Deus Uno: “O deus é dia noite, inverno verão, guerra paz, saciedade fome; mas se alterna como fogo, quando se mistura a incensos, e se denomina segundo o gosto de cada” (Fragmento 67).
Diógenes Laércio escreve do pensamento de Heráclito que tudo nasce do fogo e pelo fogo é consumido em períodos determinados por toda eternidade. (cf. Os Pré-Socráticos…p. 75). Deste modo podemos dizer que o fogo é o elemento que expressa as características de mudança contínua. É o que o fragmento 30 exemplifica: “Este mundo, o mesmo de todos os seres, nenhum deus, nenhum homem o fez, mas era, é e será um fogo sempre vivo, ascendendo-se em medidas e apagando-se em medidas”.

A idéia de Logos que estava somente implícita nos milesianos encontra expressão em Heráclito: “Pois uma só é a coisa sábia: possuir o conhecimento que tudo dirige através de tudo” (Fragmento 41).

E embora fosse um físico, abre uma pequena fresta para a idéia da imortalidade da alma: “Limites de almas não os encontrarias, todo caminho percorrendo; tão profundo logos ela tem” (Fragmento 45).

Podemos ainda opinar sobre a possibilidade de Heráclito ter sido influenciado pelo orfismo, por causa de alguns fragmentos que podem justificar a trasmigração das almas, porém não se pode afirmar com certeza a conexão entre sua filosofia da physys e as crenças órficas.

Por fim, as idéias presentes nos fragmentos de Heráclito perpassam gerações, continuando, no entanto, com a mesma validade. Seu pensamento foi tão importante que continuou influenciando pensadores como Hegel, que por exemplo, chega a afirmar não haver frase de Heráclito que não tenha integrado em sua lógica (cf. Pré-socráticos…p.92).
Poderíamos também associar o materialismo histórico de Marx à influência heraclitana, pois se baseia na luta de classes e na revolução dos oprimidos contra os opressores. Assim, é possível compreender a natureza das coisas e dos acontecimentos sob a ótica do devir, podendo interpretar nosso momento presente como algo que volta a acontecer bem como algo que dará lugar a um novo vir-a-ser.


Fragmentos transcritos do livro:
PRÉ-SOCRÁTICOS. 2. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1978. (Os Pensadores)


Bibliografia:

MONDINI, Battista. Curso de Filosofia: os filósofos do ocidente. 4.ed. São Paulo: Paulinas, 1981. V.1.

PRÉ-SOCRÁTICOS. 2. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1978. (Os Pensadores)

REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario. História da Filosofia: Antiguidade e Idade Média. São Paulo: Paulinas, 1990. (Coleção Filosofia). V.1.

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